DOI: 10.18441/ibam.22.2022.81.55-68

 

 

 

 

Prisão e memória na Espanha franquista de El vano ayer, de Isaac Rosa

Prison and Memory in Francoist Spain: Isaac Rosa’s El vano ayer

Isabel Araújo Branco

CHAM, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas/FCSH, Universidade NOVA de Lisboa, Portugal

ibranco@fcsh.unl.pt
ORCID iD: https://orcid.org/0000-0003-2204-5501

Imagem da prisão: espaço, acção e significado

A prisão constitui, pois, um espaço central em El vano ayer. Não o cárcere para quem aguarda julgamento ou quem cumpre uma pena, mas a prisão antes da constituição dos processos judiciais, ou seja, um lugar de interrogatórios e tortura. Este “e” deve ser sublinhado, visto que nalguns momentos contactamos com torturas que não surgem na sequência de interrogatórios, antes os precedem, numa manifestação gratuita de crueldade que visa exercer de facto um poder total sobre os detidos, à mercê da vontade e do capricho dos agentes, num acto ora de castigo puro e exemplarizante, ora de aviso dissuasor de futuras acções de resistência dos próprios presos e de terceiros. O que leva as personagens a esta situação? Suspeitas (por vezes vagas) de envolvimento mesmo se indirecto em acções políticas contra o regime; participação em movimentos estudantis ou reuniões clandestinas; ou mesmo a simples pichagem de uma parede.

No romance, a prisão surge como prolongamento natural da acção judicial no espaço público (ruas, universidade) e no espaço privado (casas) e como espaço por excelência da acção da polícia política, onde os agentes possuem todo o à vontade para agir com liberdade e impunidade abusando intencionalmente do poder até atingir os seus objectivos: conseguir informações sobre organizações políticas clandestinas e as suas acções e alcançar “confissões” que sirvam de base a “processos judiciais”. Temos também a prisão como espaço de solidão e isolamento –o contrário do ambiente natural do ser humano, isto é, uma existência em sociedade e em comunicação, numa co-dependência constante em relação a outros– e como espaço de visibilização da humanidade: a inteligência, a coragem, a resistência mental, emocional e física (e os seus limites), mas também a crueldade, o despotismo, a violência e o medo. Tudo características comuns, sem a existência de “super-heróis” ou “super-vilões”. Como a prisão é também um espaço de morte (as de Martínez, Enrique Ruano ou José Luis Cancho), instala-se um medo atroz na sociedade, não apenas em relação às torturas mas igualmente a figuras como os “chivatos”. O medo, aliás, constitui o primeiro passo da tortura, quando o preso está isolado, antecipando-a, num terror mental que pode levar à confissão voluntária: “son pocos los que aguantan, no el dolor, sino la mera perspectiva del dolor” (Rosa 2012, 127). E a tortura não é apenas referenciada no romance, havendo descrições directas e indirectas por torturados e torturadores. O narrador justifica a necessidade de o fazer como forma de evitar que se tire importância a essa prática tão repetida ao longo de décadas e afectando tantas pessoas:

Porque hablar de torturas con generalidades es como no decir nada; cuando se dice que en el franquismo se torturaba hay que describir cómo se torturaba, formas, métodos, intensidad; porque lo contrario es desatender el sufrimiento real; no se puede despachar la cuestión con frases generales del tipo “la tortura era una práctica habitual” o “miles de hombres o mujeres fueron torturados”; eso es como no decir nada, regalar impunidades; hay que recoger testimonios, hay que especificar los métodos, para que no sea en vano (Rosa 2012, 156).

Ainda assim, não é possível passar a experiência a palavras. Como diz um dos torturados, “no sirve de nada que intente transmitir el dolor que sentía, porque eso sólo puede conocerse al experimentarlos, no existe vocabulario que lo describa” (Rosa 2012, 165).

A prisão é apresentada também como um labirinto durante a permanência em Sol de um companheiro de André Sánchez (mesmo se os movimentos dentro do edifício são desmentidos por um agente posteriormente), aproximando a descrição do percurso realizado pelo rapaz no interior do cárcere a um universo simbólico e metafórico literário, campo tão debatido nesta obra, passível de leituras intertextuais com outros labirintos literários. O labirinto, recordemos, é um espaço construído com o objectivo de dificultar ou impossibilitar a descoberta da saída e, portanto, funcionando na prática como lugar de detenção. O mais imediato (por ser um modelo arcôntico) é o labirinto do Minotauro. Segundo a versão clássica, trata-se de um espaço de prisão tanto do monstro como de quem aí é lançado para aplacar a sua fúria. Contudo, outras versões poderão ser-nos mais úteis, nomeadamente a do argentino Julio Cortázar, Los reyes (1949). Nesta peça de teatro, o labirinto é um espaço de libertação onde o Minotauro acolhe os jovens e lhes dá todas as condições para que desenvolvam e pratiquem os seus dotes artísticos. Minos deseja mantê-lo lá dentro vivo e Teseu quer matá-lo, como forma de manter ou aumentar o poder político e social, não hesitando em utilizar qualquer meio contra o pacífico e passivo Minotauro, nomeadamente violência gratuita e desproporcionada. Minos alude a “los pueblos siempre temerosos” (Cortázar 2004, 42) e diz que os homens são o “sostén de los tronos” (Cortázar 2004, 43), referindo a população de Creta, “que me elogia por tener en mis manos el monstruo. […] No es al cabeza de toro que entrego los atenienses […]” (Cortázar 2004, 39). O mesmo fazem os torturadores no labirinto que é a prisão de Rosa, agindo contra presos desarmados e isolados, numa aproximação que se agudiza quando recordamos que Cortázar, no prólogo à edição bilingue em francês, classifica Teseu como “el joven fascista” (Grimblatt 1986, 89). Há, pois, uma inversão de papéis. Segundo afirmações públicas, os detidos constituem um perigo para a sociedade e ferem-se sozinhos enquanto os polícias pretendem o “bem comum”. Na verdade, são apenas torturadores, alguns sem ter sequer convicções políticas, como se se tratasse de um trabalho qualquer. Por seu lado, o Minotauro de Los reyes é um “mecenas” protector das artes e Teseu um homem ambicioso que egoisticamente usa uma violência extrema para o matar, indirectamente destruindo aquele paraíso de artistas. Tanto os polícias de Rosa como o Teseu de Cortázar usam pacifistas para se valorizar a si próprios e se afirmarem como fundamentais na defesa da res publica, aumentar a dependência dos outros face a si e, portanto, do seu poder. Esta não é o único tipo de subversão que encontramos no texto, visível, por exemplo, na paródia da detenção de Marta e na representação da prisão como um local de riso. A paródia, como se sabe, pode funcionar simultaneamente como imitação burlesca e como crítica satírica a costumes, classes sociais e opções políticas.

Encontramos no romance também referência às “prisões de mulheres” (e, no seu interior, às tentativas forçadas de desfeminização) e às “prisões infantis” (onde são encerrados os filhos de republicanos). Há todo o tipo de prisões num país que se transformou num cárcere: não se pode sair nem entrar livremente, vive-se sob o controlo da polícia, não há liberdade de expressão ou acção. É uma prisão inclusive fora da prisão. Na verdade, o cárcere prolonga-se fora do espaço físico do Sol: os presos permanecem com traumas psíquicos ou enlouquecem e são internados em manicómios; alguns corpos deixam de funcionar normalmente para o resto da vida; os detidos têm à sua frente desemprego e ostracismo social. No entanto, há outras consequências: por um lado, a consciencialização da verdadeira natureza do regime por parte de familiares de detidos, que compreendem a desproporção da repressão: “él sabía la verdad: que me habían machacado, que habían machacado a su hijo por hacer una pintada en una pared” (Rosa 2012, 73). Por outro, a busca incessante dos parentes e amigos desaparecidos, numa permanente indefinição e desconhecimento, sem a possibilidade de saber quando parar de procurar e de, então, fazer o luto, em particular na busca de André Sánchez pela sua avó, pela namorada e por um amigo ao longo dos anos. Como escreve Edurne Portela em “La escritura de la memoria en la nueva narrativa en español: una perspectiva transatlântica”, o desaparecimento de Sánchez mas também de Denis são recontextualizados no romance e posto em ligação com o pós-franquismo:

El abuso hacia los detenidos políticos se entrelaza después, o incluso se transforma, en el maltrato a los elementos subversivos o indeseables de la sociedad, ya sea el inmigrante o el que roba para sobrevivir. […] Aquellos que desaparecen de la historia por no haberla ganado se entremezclan en El vano ayer con los que literalmente desaparecen porque se les hizo desaparecer […]. La novela, de hecho, acaba sin dar solución a las preguntas iniciales sobre Sánchez o Denis (Portela 2011, 193-194).

Tal está relacionado com uma outra consequência: a presença desta polícia no aparelho do Estado após a morte de Franco, que contribui para um desinteresse oficial em apurar o que aconteceu aos presos durante a ditadura, tema a que regressaremos mais à frente.

Um apontamento mais: com frequência o narrador utiliza o vocábulo “Sol” (de “Puerta del Sol”) para designar prisão, interrogatórios, violência e tortura. Registe-se a inversão do sentido literal da palavra (o nome de um astro fonte de luz e de vida), sendo associada no texto a escuridão, dor e a trevas intelectuais, políticas e cívicas.

Através do romance, Isaac Rosa transforma aquela prisão num “lugar de memória”, conceito proposto por Pierre Nora para definir lugares reais ou mentais que consubstanciam determinada experiência de uma comunidade. Nora explica:

Os lugares de memória nascem e vivem do sentimento de que não existe memória espontânea, de que é preciso criar arquivos, de que é preciso manter aniversários, organizar celebrações, pronunciar elogios fúnebres, notariar actos, porque estas operações não são naturais. […] Sem vigilância comemorativa, a história dissipá-los-ia rapidamente. Eles são bastiões que servem de apoio. Porém, se aquilo que eles defendem não se encontrasse ameaçado, também não teríamos tido a necessidade de os construir (Nora 2016, 57).

Neste caso, há, de facto, necessidade de manter e divulgar uma memória sobre aquele espaço, dado que hoje a prisão que ali funcionou não é sequer assinalada por uma placa que recorde a sua existência aos transeuntes. “Hay una placa para las víctimas del atentado de Atocha y también para los que se levantaron el dos de mayo. Entonces, ¿por qué nada recuerda las víctimas de la dictadura?” (García Pozo 2018, s.p.), questionava, em 2018, Chato Galante, preso durante o franquismo e membro da Associação “La Comuna”, em entrevista. Aleida Assmann considera que os lugares, mesmo se não possuindo uma memória imanente, são importantes na construção de espaços de recordação cultural: “Eles não só consolidam e autenticam a recordação ao ancorá-la localmente, no terreno, como também incarnam uma continuidade da duração, que suplanta a recordação relativamente efémera de indivíduos, épocas e também culturas, que se encontra concretizada em artefactos” (Assmann 2016, 142). Assmann destaca também os “lugares traumáticos”: espaços de perseguição, humilhação, derrota e morte, que “possuem um lugar destacado na memória mítica, nacional e histórica” e são “inacessíveis a uma construção de sentido afirmativo” (Assmann 2016, 143). Caracterizam-se pelo “facto de a sua história não ser narrável. A narração desta história está bloqueada pela pressão psíquica do indivíduo ou por tabus sociais da comunidade” (Assmann 2016, 143). Daí que, em El vano ayer, não se conheça exactamente o que aconteceu a Denis e a Sánchez e se multipliquem as versões sobre o que se passava durante as detenções.

Neste sentido, importa recuperar também o conceito de “memória na literatura” (Erll e Nünning 2016) ou “mimese da memória” (Neumann 2005) que corresponde à representação literária da memória individual e colectiva, tal como é feita no romance de Rosa, reconstruindo e reelaborando recordações. Igualmente relevante é o conceito de “literatura enquanto meio de memória cultural” (Assmann 1995), que reconhece a “natureza mediadora de textos literários e as funções que estes desempenham na formação e transformação de memórias culturais”, como explicam Ansgar Nünning e Astrid Erll (2016, 248). Para os críticos, a relação dialógica entre a literatura e os discursos extraliterários partem da premissa de que “a literatura se refere à realidade cultural extratextual, tornando-a visível por meio da ficção” (Nünning e Erll 2016, 257). Trata-se, pois, da visibilização de algo que deve ser conhecido por todos, num contributo para a construção da “memória colectiva”, conceito de Maurice Halbwachs (1925) que demonstra como a união entre seres humanos tem como base a partilha de recordações e que estas estabilizam e simultaneamente são estabilizadas pelo grupo: “[…] cada memória individual é um ponto de vista sobre a memória colectiva, esse ponto de vista muda conforme o lugar que ocupo nela, e este lugar, ele mesmo, muda conforme as relações que mantenho com outros meios” (Halbwachs 2016, 49). É esse puzzle que Rosa vai construindo a partir de peças individuais e colectivas, recolocando-as num panorama mais alargado, estabelecendo uma posição de maior equilíbrio entre elas e dando maior visibilidade a elementos que, em geral, são mantidos em posições mais discretas. Porque há uma concepção cívica por trás desta reedificação. Como afirma Alison Lansdberg (2004) referindo-se à “memória proteica”, há um potencial ético e político que se reflecte, por exemplo, na intervenção em políticas de identidade contemporâneas. Daí que Isaac Rosa, em “Y pese a todo, necessitamos más novelas sobre la Guerra Civil” (prólogo a La Guerra Civil como moda literaria, de David Becerra Mayor), defenda que, apesar da profusão de títulos sobre a Guerra Civil, continuam a ser necessárias novelas sobre o tema, “novelas que iluminen las muchas zonas de sombras que todavía existen en aquellos años –y en su prolongada onda expansiva: dictadura, transición y democracia–” (Rosa 2015, 14). Porque “estamos todavía faltos de ficciones que nos ayuden a saber de dónde venimos, quiénes somos, cómo hemos llegado hasta aquí, y cómo podemos transformar nuestro tiempo” (Rosa 2015, 14). Ou seja, procura-se compreender o passado para construir um outro futuro, consciente e informado, assente em princípios verdadeiramente democráticos. Pontua João Luís Lisboa em Então, o Quê? A História que (se) Conta é Problemática:

A ficção sobressai com um grande número de produtos que fornecem informação e moldam o imaginário das populações. Em muitos casos, este imaginário é doloroso, e cabe aos textos um exercício de reflexão, de explicação, de introspecção, de catarse. […] criando a distância que se diz faltar à memória, ao mesmo tempo que cruza personagens que, nos conflitos vividos, representam posições antagónicas e trabalham sobre os dados reais que a ficção sublinha (Lisboa 2018, 262).

Como afirmou o próprio Isaac Rosa durante o Seminario Internacional “Narrando la grieta: Isaac Rosa y los imaginarios emancipadores en la España actual”, realizado na Universidad de Alcalá em 2021, a sua obra literária é pautada por um “sentido de responsabilidade” (mais do que um “compromisso político”), que se reflecte precisamente neste contributo para a sociedade espanhola. Mais à frente recuperaremos à questão da responsabilidade.

Polifonia e ausência de coros

El vano ayer é um romance polifónico pela profusão de vozes, de memórias, de opiniões, de sugestões, de hipóteses levantadas e de fontes de diferente natureza, de “testemunhos” a “manuais de tortura”, passando por citações historiográficas. Pablo Sánchez León fala também do cruzamento de áreas, nomeadamente no que diz respeito aos torturadores e recorda que:

los problemas a los que se enfrenta el literato, el científico social y el historiador son en una cierta medida análogos: en todos los casos, y más allá de ofrecer un relato verosímil y coherente sea a partir de la documentación disponible o desde la imaginación, el observador necesita dotarse de una imagen de la personalidad del perpetrador, es decir, necesita encarar la cuestión de la identidad del victimario. […] al silencio del perpetrador solo se puede poner voz construyéndola con aportes procedentes de la imaginación. De ahí que hablemos de sinergia entre disciplinas y saberes (Sánchez León 2018, 180).

A narrativa de Rosa integra pontos de vista e versões de polícias, de presos e de terceiros que pretendem complementar-se entre si. Essa polifonia (numa tentativa interna de corroboração e com frequência de desmentido) reflecte a necessidade de se fazer na sociedade espanhola “el esclarecimiento de la verdad, a la que se deben los jueces, que están obligados a investigar de oficio los crímenes hasta explicar las causas de la muerte de las víctimas, lo cual implica identificar a los criminales o responsables de la represión” (Sánchez León 2019, s.p.). Isto aconteceu porque, “la transición a la democracia estuvo presidida por la impunidad institucional y la aquiescencia social, cuando no la exoneración cultural de los victimarios” (2019, s. p.). Sánchez León refere “la articulación de un discurso que tampoco es negacionista sino que se mantiene leal al contexto de origen de los actos, solo que su actitud es presentada en un lenguaje estético que […] funciona como un mecanismo de exoneración de responsabilidad, y en última instancia de impunidad” (Sánchez León 2018, 179).

Ao contrário do que acontece com os antigos presos, os pontos de vista e as versões dos polícias de El vano ayer não têm como objectivo recuperar a sua memória, mas antes defender o seu comportamento face a acusações de violência, crueldade e abuso de poder feitas por pessoas concretas, instituições e alguma opinião pública no período democrático. “[La] leyenda negra de la Dirección General de Seguridad estaba muy extendida por los relatos embusteros de los comunistas” (Rosa 2012, 281), argumenta um agente. Na verdade, trata-se de respostas em defesa própria, não de “testemunhos” espontâneos, como, aliás, acontece tipicamente com os agressores, cuja atitude mais comum é o silêncio no período democrático. Como explica Sánchez León:

el hecho de callar y no testimoniar no responde solo ni a veces en primer término a una estrategia de librarse de una posible condena judicial: también tiene que ver con la lealtad que muchos perpetradores sienten hacia la comunidad de referencia con la que se identificaban cuando cometieron los crímenes. […] el silencio y la no colaboración son la respuesta esperable para quienes entienden que los nuevos valores dominantes en un régimen que condena sus actos como crímenes son demasiado contrarios a los antiguos como para garantizarles un reconocimiento, sea este social o institucional (Sánchez León 2019, s. p.).

Sánchez León sublinha ainda que normalmente “los victimarios no luchan por el reconocimiento de su inocencia, sino que se mantienen en el silencio y el anonimato, corriendo más bien el riesgo de ser señalados por testigos de sus crímenes” (Sánchez León 2019, s.p.).

Em rigor, as versões e “testemunhos” dos polícias no romance acabam por contribuir para uma versão da História que matiza a violência do Estado e que faz uma aproximação forçada e artificial dos dois “lados” da “contenda” (na sequência da guerra) como estando equiparados (e como se, na guerra, tivessem utilizado o mesmo grau de violência e tivessem a mesma legitimidade, os mesmos meios técnicos e humanos e a mesma responsabilidade no conflito e nas suas consequências). Essa versão da História serve, aliás, os interesses políticos do aparelho franquista e dos seus herdeiros no período democrata, que, em muitíssimos casos, continuam a ocupar lugares na administração do Estado (incluindo na política, na polícia e no exército), prolongando assim o seu poder, influência e capacidade de intervenção social, económica, política e cultural, naturalmente agindo em prol dos seus interesses específicos, entre eles evitar o registo de versões da História de Espanha que os retratem de uma forma pouco abonatória face aos actuais princípios de cidadania, assentes em valores como a liberdade de expressão, a ausência de censura, a existência de eleições livres e a legalização de todos os partidos democráticos. Assim, pretende-se a constituição de uma memória colectiva que seja o seguimento da versão oficial franquista da História espanhola do século xx. Alberto Reig Tapia assinala doze “mitos franquistas fundamentales que los historietógrafos se han empecinado en seguir haciendo valer a estas alturas del siglo xxi” (Reig Tapia 2012, 909), entre eles “el distorsionado terror desencadenado por los rebeldes y la represión franquista (justicia debida) como muy limitada respuesta al masivo terror rojo previo” (909). Reig Tapia considera que “la historietografia ha tratado y trata en todo lo posible de blanquear” (912) o terror e a repressão. Julio Aróstegui fala em historiadores “retrovisionistas”, que “vuelven a los argumentos que ya emplearon los vencedores en los años 40 y aún en los años de la guerra misma” (Aróstegui 2007, 27). Fazem-no, sublinhamos nós, em função dos seus interesses no século xxi, procurando prolongar o projecto político, social e económico franquista. Aróstegui salienta que a memória histórica “es asunto demasiado importante para dejarlo en manos de quienes no quieren tenerla en cuenta” (2007, 28). Sebastiaan Faber, Pablo Sánchez León e Jesús Izquierdo Martín reflectem que “frente al militante empirismo que subyace a toda la controversia, todo conocimiento sobre el pasado adopta siempre la forma de una interpretación de acontecimientos cuyos marcos de significado están predeterminados por el contexto social en el que ésta es elaborada” (Faber, Sánchez León e Izquierdo Martín 2011, 47). Como exemplo recuperam a frase de Santos Juliá “la memoria es una cosa y la historia es otra”, representativa de “una actitud paternalista y desdeñosa cuando no hostil hacia las movilizaciones ciudadanas en relación con la recuperación del pasado traumático” (Faber, Sánchez León e Izquierdo Martín 2011, 45).

Dizíamos que a versão dos polícias no romance de Rosa surge no seguimento da versão franquista da História. É uma tentativa de contrariar não apenas a implantação de um regime formalmente democrático, mas acima de tudo a circulação de versões da História que contemplem e privilegiem a voz da resistência, História feita pelos historiadores, mas construída igualmente por outros intervenientes sociais como os escritores. Nesse grupo podemos, pois, incluir Isaac Rosa e El vano ayer. José Luis Ledesma nota que o século xxi “trajo consigo la irrupción en la escena pública de un movimiento asociativo reivindicador de la “memoria histórica” que ha disparado exponencialmente el interés por la violencia –sobre todo la franquista– y lo ha llevado no sólo a nutrir aún más la actividad investigadora sino también a una explosión de atención mediática, temas, títulos y suportes que desbordan con mucho la literatura histórica” (Ledesma 2009, 166). Porque, como comenta Rita Rato na citada entrevista, “se não se contar, se não se partilhar, se não se instruir a memória a partir do que foram as experiências da resistência à ditadura e da defesa da liberdade e da democracia, este é um espaço que será ocupado no sentido inverso” (Carvalho 2021, s.p.). Esse trabalho é complexo quando se pretende incluir as vozes dos repressores. Como indica Pablo Sánchez León:

la tarea que le espera [al autor] no es solo ni en primer lugar acumular información y elaborar interpretaciones: se necesita de una postura moral que permita al observador sobreponerse a la desestabilización psicológica que el objetivo puede acarrear. […] Para sobreponerse al conocimiento del mal ha de haber un motivo algo más acuciante para el observador, algo que ponga en juego su propia identidad, no como observador sino como sujeto que necesita también asegurarse un espacio moral para dar sentido a sus actos y a su vida en comunidad (Sánchez León 2018, 181).

Tal trabalho implica o reconhecimento crítico do papel desempenhado por literatos, intelectuais e académicos fascistas na “maquinaria que produjo crímenes contra la humanidad” (Sánchez León 2018, 181) e que “en general se han obstinado en mantener a los ciudadanos atrapados en una película de amnesia instituida” (Sánchez León 2018, 181). Nesse complexo processo, acrescentamos nós, desempenham também um papel importante académicos, intelectuais e escritores democratas como contrapeso na reposição de um retrato mais próximo do que terá, de facto, acontecido. Rosa faz, sem dúvida, parte deste grupo.

O que há de vão no passado?

O título do romance, El vano ayer, é retirado de versos do poema “El mañana efímero”, de Antonio Machado, escrito em 1913 e integrado em Campos de Castilla. O próprio poeta foi vítima do franquismo, morrendo em Coullioure, em França, em 1939. Uma das epígrafes do romance corresponde a dois versos do poema de Machado (“El vano ayer engendrará un mañana / vacío y ¡por ventura! pasajero.”) que aponta para um futuro vazio, numa leitura pessimista da actualidade. Contudo, recuperando o poema completo, verificamos que esse “amanhã” não é o único possível, apontando antes para uma alternativa nova e positiva, a de uma “otra España” que nasce, Espanha “redentora”, “vengadora”, a Espanha “de la rabia y de la idea” (Machado 1999, 148). Esta alternativa, esta outra e nova Espanha, é feita também de obras como o romance de Rosa. O título acaba, portanto, por ter uma leitura irónica: o passado de resistência antifranquista não foi em vão, teve frutos, entre eles a instauração de um regime democrático e a transmissão de testemunhos (memórias individuais não franquistas) e igualmente a passagem de testemunho (ou seja, o sistema de herança) de luta e resistência, dos valores de liberdade e democracia popular da II República a outras gerações, que recebem essa herança e a resignificam e actualizam através, por exemplo, de obras como El vano ayer.

A meio da obra, o “autor” é interpelado por “un grupo de radicalizados lectores” (Rosa 2012, 189) que exige a introdução de uma personagem que “amplíe la idea central de que el vano ayer ha engendrado un mañana vacío” (Rosa 2012, 189), isto é, que as acções do passado republicano e antifascistas foram infrutíferas e que de nada serviram. Prova disso seria não ter havido uma ruptura com o franquismo e que os “funcionarios represores” continuaram e continuam nos seus postos públicos, não tendo sido depostos durante a democracia e, nessa medida, ter sido “vano” o passado de resistência. Funcionaria indirectamente como um desincentivo à mobilização actual, indicando que um projecto político revolucionário seria impossível de concretizar hoje. Aliás, David Becerra Mayor em La Guerra Civil como moda literaria, alerta que muitas das narrativas sobre o conflito, não pretendendo ser cúmplices do franquismo, ainda assim incluem a ideia de que o passado que se perdeu na Guerra Civil corresponde à possibilidade de construir uma experiência revolucionária em Espanha. Para Becerra Mayor, a maioria da literatura actual –enquanto produto da ideologia do capitalismo– legitima as condições de exploração e a sua concepção de mundo, escreve a partir de um “hoje” (que corresponde ao passado vencedor) que pôs fim à possibilidade de existir em Espanha uma experiência revolucionária: “La novela sobre la Guerra Civil española no pretende en ningún caso redimir ese pasado no amortizado que es el de la revolución perdida. Por ello, la memoria en sus páginas no busca actualizar el pasado frustrado, no busca el regreso de ese pasado en nuestro presente ni pretende visibilizar a la clase obrera como sujeto revolucionario” (Becerra Mayor 2015, 376-377). Também Isaac Rosa reage contra o mesmo. Como comenta Germán Labrador Méndez, Rosa “quiere establecer límites para las formas que están contando el pasado reciente, entendiendo por éste el continuum histórico de acontecimientos, mitos y relatos que unifican actualmente el siglo xx español bajo la categoría narratológica de la memoria histórica. […]” (Labrador Méndez 2011, 123). Face a:

un nuevo relato hegemónico sobre el pasado, cabe considerar un insospechado e irónico efecto secundario: la posibilidad de la naturalización contemporánea de ese pasado, donde los relatos superadores de un eventual olvido histórico fuesen a acabar borrando justamente aquellas experiencias de dolor y violencia sobre las que habría debido edificarse el debate público y los relatos institucionales asociados (Labrador Méndez 2011, 124).

Recordemos que Rosa, no discurso de aceitação do Prémio Rómulo Gallegos, em Caracas, em 2005, abordou precisamente a questão da responsabilidade dos escritores na construção dos discursos sobre o passado e sobre o presente, criticando uma literatura sem responsabilidade que reitera a visão política dominante sobre o passado:

Existen entre nosotros, en cada país y en el mundo, conflictos y problemas que no tienen reflejo en una ficción que muchas veces es cómoda, despreocupada, ombliguista. Cuestiones graves que quedan al margen de la ficción, como si no existieran. Y en la percepción de los lectores, en la construcción de la imagen de su tiempo, presente o pasado, lo que no se cuenta en las novelas o en las películas, parece no existir, o existir menos, de forma menos problemática (Rosa 2005, s.p.).

Regressemos ao poema de Machado e ao título do romance. A História indica precisamente que, tentando, é possível alcançar uma outra sociedade, embora as versões da História que são dadas ao grande público, sendo parciais e muitas delas visando objectivos políticos de direita, pretendam apontar para outro caminho. O próprio “autor” de El vano ayer dá uma resposta a esta questão no fim do referido capítulo: “De acuerdo en que el vano ayer pueda engendrar un mañana vacío, pero nada indica que el brutal ayer tenga continuidad en un mañana brutal” (Rosa 2012, 194). Ou seja, nada é inevitável, não há becos sem saída, não há garantias deterministas e fatalistas. Pelo contrário, diz-nos o poema de Machado que a expectativa é surgir uma Espanha “redentora”. E isso depende do que se fizer hoje, do que se fizer também com o que nos resta do passado (a sociedade herdada, mas também os princípios e as visões sobre o próprio passado) e do que for construído a partir disso, olhando para o presente e transportando uma determinada perspectiva sobre o que aconteceu no passado. A visão deste romance tem por trás uma crítica ao franquismo e um projecto político de esquerda para a actual sociedade espanhola, tendo como meio o próprio livro e a sua leitura, isto é, a literatura, a cultura e o debate intelectual. É nesse sentido que a citada directora do Museu do Aljube, Rita Rato, considera que “a educação para os direitos humanos, a cultura da resistência, a partilha desse universo é fundamental” (Carvalho 2021, s.p.), salientando a importância de “ligar as questões da resistência às resistências de hoje: em torno das questões mais gerais da participação estudantil […] em torno das lutas ambientais, das questões LGBTIQ+, das mulheres, do colonialismo e do anti-racismo” (Carvalho 2021, s.p.). Faber, Sánchez León e Izquierdo Martín assinalam que a crescente presença na esfera pública de uma opinião mobilizada e organizada que defende o seu direito a contar a História espanhola traz consigo não “la nostalgia por unos tempos pasados mitificados sino el de la libertad de interpretación del mundo por parte de los ciudadanos, algo que se garantiza cada vez que se termina con algún monopolio en términos de conocimiento” (Faber, Sánchez León e Izquierdo Martín 2011, 58). João Luís Lisboa ajuda-nos a compreender este panorama quando afirma que o “esforço, institucional e cidadão, em prol do resgate da memória de períodos de violência, não pode aspirar a consensos, mas pode contribuir para o encontro de soluções políticas” (Lisboa 2018, 259). Lisboa afirma que em países onde esse trabalho não foi feito, como em Espanha, “a transição para a democracia vive de equívocos persistentes e de memórias incompatíveis, com consequências na ideia de legitimidade do poder, pois a própria instituição monárquica do Estado Espanhol está assente nesses equívocos de memória” (Lisboa 2018, 259).

O Minotauro de Cortázar em Los reyes ameaça Teseu com a sua presença post mortem e o seu desdobramento no âmago de todos os seres humanos, caso este o fira: “Desde allí cornearé tu trono, el cetro inseguro de tu raza… Desde mi libertad final y ubicua, mi laberinto diminuto y terrible en cada corazón de hombre. […] Cuando el último hueso se haya separado de la carne, y esté mi figura vuelta olvido, naceré de verdad en mi reino incontable. Allí habitaré por sempre” (Cortázar 2004, 66-67). Não é possível fazê-lo desaparecer, garante o Minotauro. A sua voz permanecerá viva e em liberdade, como a das vítimas da prisão de El vano ayer, precisamente também através do romance. Porque, como lemos no texto de Rosa, “ya está bien de palabrería que parece inocente y está cargada de intención, ya está bien de repetir la versión de los vencedores” (Rosa 2012, 249).

Referências bibliográficas

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Fecha de recepción: 20.02.2022 Versión reelaborada: 04.05.2022 Fecha de aceptación: 15.06.2022

 

 

 


1 Além de constituir um espaço de detenção, na antiga Prisão do Aljube eram feitos interrogatórios aos presos políticos. A espera para os interrogatórios na sede da PVDE/PIDE, situada na Rua Maria Cardoso, era, em geral, feita no Aljube. Actualmente a sede da PIDE na R. António Maria Cardoso é um condomínio fechado, enquanto o edifício da prisão do Aljube foi transformado num museu sobre todo o tipo de resistência à ditadura e respectiva repressão, o que inclui os interrogatórios e torturas na Sede da PIDE.